quinta-feira, junho 19, 2014

De algumas folhas

Folha 1

Não gostaria de estar aqui
preso comigo mesmo
em casa
chove desde que eu acordei
no fim|da tarde
completa minha ilha


______________________



O segredo endurecido pelo tempo

O depressivo teme que descubram
sobre seus sentimentos, sobre seus
pensamentos e atos. Ele teme o
julgamento e o castigo; seu segredo
é como um erro. É um mal,
algo errado, e por isso ruim.
Precisa ser escondido dos outros,
livrado de toda explicação.


______________________


Folha 2

In a sentimental mood

Só me resta o silêncio da espera

O segredo da "endurance":
    não ter tempo para os
    outros.
    não precisar ter tempo para
    os outros.

______________________


A multidão é o lugar do encontro
ela nos une, permite encontros improváveis
mas ela também nos separa

A multidão é o lugar do encontro,
mas ela não nos une apenas, ela também nos
mantêm terrivelmente distantes.
Encontro alguém, mas talvez não o consiga alcançar
Tão rápido o olhar estabelece um ponto, no
instante seguinte ele se vai foi perdido.
O encontro de olhares, que se perdem, que
se buscam, sem tempo, sem espaço.
A mulher que nos olha, e que é engolida pela
apressada e raivosa multidão, sem nunca olhar para
trás. Talvez já tenha nos esquecido, talvez nunca
tenha realmente nos notado. Um instante e tudo
está perdido, como se nunca houvesse de fato
acontecido. A multidão é um sonho que sonha
a si mesma.


______________________


Folha 3


Eu não quero curar minha tristeza

tenho vontade de sair e ver a cidade
aqui é tudo tão...
pouco

Uma repetição que não se move

(...)

______________________


Aqueles desesperados por amar –
estão condenados
objetos do desejo

______________________

Por vezes
eu não percebo
que a música
parou

A música preenche
um vazio.
Quando me refugio
nela, e
o silêncio
se faz sentir.

(Mas...)

Quando os pensamentos
se ordenam
trabalhando
posso me
ouvir
melhor.


Uma garota

É difícil dizer o que mudou desde então

Não consigo dizer aquela frase, tão comum
tão fácil em outros tempos...

Mas, será que alguma vez foi?

No entanto, percebo:
algo permanece contido em mim,
com medo de se perder.

"Não é a morte,
pois os sorrisos
não mentem."

Mas há uma parede
que pouco a pouco
revela seu outro lado.

(...)

alguém que se lembra

Olhando as fotos e os nomes de alguns antigos conhecidos
eu senti falta de algo, sem saber exatamente o que era.

Dias como este me fazem sentir falta de algumas coisas.

Acho que é saudade.

Bem, é sábado e chove; um dia nublado e frio.
Me pergunto se não deveria estar junto de alguém
ou fora de casa, fazendo algo, mesmo que sozinho.
(Não há resposta.)

Um dia como este faz com que eu me sinta um esquecido.
Alguém que apenas toma conta das próprias recordações,
o último reduto de um passado que se foi.
Um guarda chinês, enterrado no deserto
para sempre a serviço do imperador.

Difícil não se sentir velho, não sentir o Tempo.

O peso de um passado morto.
Porque apenas morto ele nos
serve de fardo.

É a "pilha de nada" que nos sobra.

Mas não há nada de errado com isso.
Quero dizer, é claro que é terrível,
principalmente em dias assim
que é quando isso se faz melhor sentir;
no entanto parece ser a condição
da existência.

"O maior sofrimento de todos
é nunca ter sofrido",
diz Neruda.

Estou aqui,
não é o fim.

E isso não é nenhum pouco banal
Não posso ser indiferente
Tenho que lidar com isso.

terça-feira, abril 29, 2014

Um ferroviário

O trem veloz
através do vazio 
- Eu fui um ferroviário.
Jack Kerouac


Nada sobre o que escrever no momento.

Há uma certa tranquilidade quando penso sobre esta página em branco.

Talvez ela seja a única segurança que eu tenha de fato.

Quando tudo acabar, ainda poderei riscar algumas linhas por entre o branco
como um trem que atravessa o silêncio.

E até mesmo uma longa distância no tempo
não me impede nunca de voltar
a qualquer hora.

No fundo, acho que estou apenas a dizer:

Não é tão ruim assim ficar sozinho,
talvez eu até goste
goste da minha própria companhia.

De uma mensagem para A.

Acho que ali é um reduto para tudo aquilo que não consigo dizer; para todas as palavras que não consigo dizer a ninguém: "a experiência interior".

E para algumas outras coisas também. Acho que é um espaço para não desperdiçar a palavra.
Para não desperdiçar os sentimentos.

De um naufrágio a outro

Aos poucos me vai ficando mais clara a ideia de quem são os meus amigos.

Foi no tempo que se delimitou este pensamento.

Meus amigos são os loucos e os suicidas.

São aqueles que vivem a angústia sem reservas.

Aqueles que passam as noites acordados
                         imersos em contradições
                                   pensantes

Que atravessam o tempo pesado
                              sem certezas
                              sem porto onde atracar

"É na noite que ouvimos o canto do silencio"

Há uma linha, dificilmente transponível,
            entre a nossa vivência
                             e as outras

Uma sensibilidade que nos forma
para além dos muros altos da experiência empobrecida

(...)

a continuar

uma nota pela escada

Eu nunca pude a perdoar por não ter me amado
Nunca a consegui perdoar por não ter me amado
"Não consegui a perdoar por não ter me amado"


Pensei isso descendo uma escada


Mesmo que não seja uma verdade
Foi algo que não pude evitar de passar por

São as escadas

Entre dois
Penso nisso

Meias verdades ou verdades e meia

terça-feira, março 25, 2014

A palavra

De tanto as repetir
as palavras parecem
ter perdido seu sentido.

"Me sinto sozinho"

"Estou sozinho"

Não sinto força
alguma nestas
palavras.

_______________


Mais do que apenas isto,
quando digo estas palavras
as pessoas parecem
não entender
seu significado.

______________


Eu penso em
uma palavra:
Narcisismo

Há algo que
nos impede a todos
de sentir o outro.

(...)
Já são três horas

preciso sair de casa
mas não tenho vontade alguma

abro a geladeira
e também a porta
do armário

mal consigo
pensar no que
escrever

Carta para C.; 17 de fevereiro

1

Tenho tentado, quase sistematicamente, não escrever nada nos dias em que eu mais sinto a necessidade de enviar uma mensagem para alguém; dizendo tudo que se passa.
Quero com isso evitar as colorações do desespero, da loucura, das vísceras... É uma forma de se proteger. Evitar se expor na hora mais vulnerável – ainda mais por aqui.

Nesses momentos eu tento escrever no meu blog.

Tento escrever justamente para não me calar; porém, mais importante do que dizer, talvez seja entender – se entender. Não completamente, não racionalmente, com teoremas e tabelas... com um quadro clínico e medicações...

Estou sempre a ruminar alguma questão.

Acho importante o silêncio, a tristeza.

Mas me incomoda o estado de coisas, a nossa condição. Me incomoda a vida como ela é vivida...

Mas, em nossa sociedade, a depressão e o mal-estar são vistos não como sintomas sociais de uma época, mas como disfunções individuais.

Sei que não devo parecer uma pessoas muito equilibrada ou mesmo sociável. Mas, talvez, isto seja apenas meia verdade – ou verdade e meia. Há uma parte que falta.

Diante da sua segunda pergunta, eu devo dizer que, em parte, sim. Passo muito tempo sozinho. Como se eu fosse um trabalhador em uma torre. Um trabalhador esquecido em uma torre, cuja o trabalho virou hábito. Não sei, talvez não seja essa a melhor das imagens.

Mas, para além do fato de eu passar muito tempo sozinho, eu também me sinto muito sozinho.

Bom, posso explicar melhor a situação contando como foi a exibição do meu último filme.
Para resumir: o filme é em parte o resultado dos dois anos de tcc, de inquietações de todo tipo e da discussão que eu venho tendo com meus amigos. Rolaram duas exibições.
Sabe, eu sempre fico esperando para ver se alguém vai chegar e dizer algo como: "cara, eu sinto o mesmo". Muito mais do que "eu concordo com tudo", é "eu também sinto isso" (porque eu sei que o filme não é exato e nem mesmo acabado.) Mas isso não acontece.

E Isso me desgasta um pouco.

Chegou um livro pelo correio essa semana. "Pele Negra, Máscaras Brancas" (Frantz Fanon). Uma obra que é uma porrada.

Ela começa assim, as primeiras linhas:

"A explosão não vai acontecer hoje. Ainda é muito cedo... ou tarde demais.
Não venho armado de verdades decisivas.
Minha consciência não é dotada de fulgurâncias essenciais. Entretanto, com toda a serenidade, penso que é bom que certas coisas sejam ditas.
Essas coisas, vou dizê-las, não gritá-las. Pois há muito tempo que o grito não faz mais parte de minha vida.
Faz tanto tempo...
Por que escrever esta obra? Ninguém a solicitou.
E muito menos aqueles a quem ela se destina.
E então? Então, calmamente, respondo que há imbecis demais neste mundo. E já que o digo, vou tentar prová-lo. Em direção a um novo humanismo...
À compreensão dos homens..."

Um amigo comparou esse trecho com meu último filme. Mas, de fato, muito disso é dito de uma outra forma no próprio corpo do filme: A necessidade de dizer algo, embora seja importante, não foi solicitada. E com isso já estamos em "terreno inimigo", em desvantagem.

("Um filme a procura de seu público?")

Acho que é por aí que se inscreve a minha solidão. É na falta de mais cúmplices; na dificuldade de ser realmente ouvido.

Gostaria de lhe mostrar meu novo filme. Farei isso em breve (e quem sabe também os filmes do meu colega).

2
Por vezes, eu me sinto um completo idiota escrevendo mensagens para os outros. Como uma criança tentando se explicara, para então, não receber nada mais, nada menos do que um gesto paternal consolador. Quando isso acontece, nunca sei ao certo se isso é uma predisposição das pessoas ou se eu, em algum momento, deixo me sujeitar.
Já tive problemas muito sérios com baixa-autoestima, desenvolvi até mesmo mecanismo de auto sabotagem. (Uma máquina de pensamentos negativos que sufocam.) Então, nunca vou saber ao certo qual o peso de cada. 
De certa, há também nisso um preciosismo pelos sentimentos. Um depressivo nunca quer que você diga a ele o que fazer, nunca pede uma solução. Principalmente quando ele entende que você não sabe como ele se sente.
Talvez haja certa justeza nisso. Mas, em ambos os casos, parece que um nega ao outro alguma coisa. Tanto naquele que ouve e julga, como naquele que narra e acha que o outro simplesmente não pode entender pois não sentiu.
Citando outra vez: O Ungaretti diz: "uma poesia é uma poesia quando guarda um segredo". (Certas "coisas" precisam de uma chave.) Algumas cartas permanecerão para sempre com partes indecifráveis. Sentimentos que não podem ou não puderam ser verbalizados, escritos; mas que estão lá de alguma forma. Estava a pensar nisso e em mais algumas coisas... É difícil a gente mudar alguém. No máximo conversamos, compartilhamos coisas, discutimos... Mas apenas a própria pessoa, sozinha consigo mesma, vai definir o que faze com os frutos desse contato, desse "assédio do mundo". 
Estava pensando... tentando definir uma maneira, uma postura igualitária para se relacionar com o outro...

3

Entendo. Sem falar que parece ser uma perspectiva completamente infundada, fora de qualquer pensamento histórico ou material. Eu ia falar mal dos vegetarianos, mas de maneira geral, a crítica social de hoje é quase toda uma droga. haha. Sem falar que muitas páginas são escritas e consumidas como se fossem "entretenimento crítico".
Sabe? Penso nos meus amigos Vegans de 25-30 anos... No final é tudo uma questão de o que pode e o que não pode consumir. O próprio pensamento crítico (sua produção, seu desenvolvimento) é deixado de lado em função da manutenção de um "lifestyle" minimamente compatível com o discurso esvaziado da propaganda vegan. Não estou dizendo que isso é pura perda de tempo, mas que já existe há muito tempo um consenso sobre o que é ser vegan, qual sua importância e sua "eficiência" no combate efetivo ao... "sistema" (não sei que palavra usar aqui).
Podemos conversar sobre arte. Tenho, inclusive, outro livro com um título que vai lhe chamar a atenção: Arte, inimiga do Povo. ah, e é claro, um não tão bacana chamado A greve da Arte... Você faz teatro, cênicas? Fico com essa impressão, apesar de achar que ela muito pouco sustentável. Tenho vontade de perguntar o que você estuda. (Algumas vezes eu acho que você é mais nova do que eu, noutras que você pode ter uns 27 anos – o que faria com que eu me sentisse bobo).
É estranho. Ao mesmo que eu acho que não te reconheceria na rua se a visse, também acho que saberia dizer que uma pessoa não é você. Já te procurei na multidão do metrô diversas vezes. Mas sei que nunca te encontrei nela...

(Estava pensando... acho que vou continuar te procurando no metrô, mesmo sabendo que não vou te encontrar lá.)
4
Últimas Músicas
Voices of Light - Pater Noster; música composta em 1994 para o filme O Martírio de Joana d'Arc (1928). Um dos melhores e mais intensos filmes de todos os tempos.



Não consigo mais escrever neste momento. No fundo, tenho um pouco de medo de ter dito demais e te cansar. Gostaria de perguntar muito mais. Mas, me pergunte do filme. Prometo que lhe respondo sobre tudo o que eu puder.
(...)

Uma ilha. Somos todos insulares.

Estou cansado. E não sei o que dizer; como dizer.
Algo me incomoda profundamente... Estou cansado.

É difícil não ser cínico.
Ainda não sei como não me tornei a pior pessoa possível.

Este é mais um dia como qualquer um: sem perspectiva, sem expectativa.

Ninguém me espera.
E não tenho para quem voltar.

Uma ilha.
Sem porto seguro...


___________________


"Isto" se arrasta pelas ruas...

Dias, semanas

Os segundos que não passam.


sexta-feira, março 21, 2014

as pessoas não se amam, elas apenas precisam umas das outras.
é por isso que somos todos tão dispensáveis.
acordar para a mesma vida
que você abandonou ontem

sentir que o passado
não continua
que ele lhe abandona
apenas

sentir que ainda
não há futuro

quarta-feira, março 19, 2014

Hoje, outra vez. Não sei como, de repente, estava "assim" outra vez. Eu precisava sair de casa, mas não conseguia, faltava vontade, faltava quase tudo. sentei no sofá e olhei para o teto. Sem movimento, sem conseguir me mexer. Queria ficar sozinho, queria dormir outra vez. Outra vez. Eram três da tarde.
Me encolhi ou deitei. Sei apenas que acabei dormindo e que não sai de casa.

segunda-feira, março 10, 2014

De uma entrevista

(...)

–Foi muito legal. Obrigado por compartilhar essas coisas comigo. Fico grato.

–É, bom, quem melhor para compartilhar isso do que um completo estranho?

Entrevista com um fotógrafo

domingo, março 09, 2014

Vagando 3 _ Para um amigo, para um estranho

Certa vez eu sai de manhã
queria apenas andar por aí

Coloquei uma roupa velha e saí de casa
tênis e jaqueta.

passei no mercado e comprei o vinho mais barato
uma garrafa

estava pronto

eram 7 horas
talvez 8

as ruas estavam todas vazias
exceto pelas principais

as ruelas e ruas residências
como vilas
que me atiravam nas avenidas movimentadas
os ônibus passavam tão rápido que tudo se movia
Eu sentia os asfalto tremer

era também a bebida

andei sem saber por onde ia,
mas sem nunca conseguir me perder totalmente
acho que eu era incapaz

eu vi a cinemateca
andei pela sena madureira
subi a rua onde dei meu primeiro beijo
via a placa onde me detive com naquele mesmo dia

e então,
me sentei em uma mureta
um pé de escada
bêbado
observando quem passava

sou um completo estranho

pensei em voltar,
mas já estava muito longe
teria de andar,
não importa para onde
em frente
ou de volta.

continuei.

minha vida toda
em um bairro.

Cheguei até a avenida paulista
o centro espúrio da cidade

desumano e movimentado

a garrafa não aguentou muito mais
por vezes achei que eu fosse vomitar

mas andei, sem ser notado
bêbado e suado

não me senti mal
melancólico e vivo
talvez

caminhei
sem procurar nada
além do esquecimento

ruas e pessoas em tudo iguais
todos os dias
não escapo à isso

mas não nesse dia.
uma aventura fraca, é verdade
mas tão cheia de liberdade quanto a ideia de um suicídio
encontrar alguma força, talvez apenas a sua potência,
em um ato tão fraco, tão débil
e que no entanto ordena algo
devolve um ponto de autonomia

Eu entendo quem sai andando por aí e desaparece
para ser apenas encontrado morto, dias depois.
ou para não ser encontrado.
Eles viram seu lugar na cidade,
e o desespero virou certeza.

Há certa calma nisso.

Não posso dizer se é um erro
ou uma fraqueza diante da ideia.

Apenas compreendo.

No final de toda a Avenida Paulista
há uma ponte, um viaduto
você pode olhar os carros lá de cima
É como o fim do caminho.

Alguns o encontram,
outros voltam.
Certos de que podem voltar ali
a qualquer momento.

Eu apenas fiquei ali parado
sem nenhum tipo de pensamento.

A norte daquele ponto
vivia uma amiga,
uma faculdade que eu frequentei.

Era apenas um ponto.

Mas não pude deixar de pensar.

Ali mesmo, 6 anos atrás,
estava eu parado
sozinho
no dia em que tentei escapar à solidão
inventando um encontro de amigos
mas pensando apenas em uma garota.
Dia dos namorados –
eu me lembro.

Dei meia volta.
A manhã já estava avançada.
Precisava voltar
Estava sem cigarros
e sem bebida.
Estava sem nada
"Purificado"

voltei de metrô.
já era meio dia.

Ninguém havia notado minha ausência.


Naquele dia ouvia
a mesma música
sem parar:

Into My Arms (Nick Cave and The Bad Seeds)

ácido

Diante da fogueira


A realidade
é a matéria
esculpida pelo fogo.


Pequenos olhos de gatos
subiam aos céus
[como] fagulhas

mensagem (incompleta) para C.

Os anos passam e eu não sei se envelheço ou se fico mais jovem.
Quando a gente passa muito tempo sozinho, uma certa forma de pureza se conservar, mas também uma forma de despertencimento, muito mais forte e abrangente, toma conta.

A inocência se vai aos poucos, dando lugar à uma rigidez fria da alma; uma torre de marfim nos oculta do mundo. Não totalmente, ainda podemos ver e sentir, mas com menos intensidade.

Quanto à mim, o fogo permanece; o sentimento de revolta ainda vive, mas já com alguma melancolia.

Talvez eu seja um jovem velho, com medo de viver; talvez apenas alguém triste, esperando ... por algo ou por alguém.

Mas é certo que... [não sei.]
Está tão frio aqui

um arrepio me percorre o corpo todo

que triste não ter para onde gritar

...
O sono me chama como a morte

quero fechar os olhos
e esquecer

mas preciso ainda ficar acordado

a viajem, a viajem

o ônibus nos levará a todos

para longe daqui
Devo ir embora
não sei

quero esquecer 
parar de pensar 
um instante que seja

a noite acabou
finalmente

a atravessei

sobrevivi aos 
meus pensamentos 


um ataque

os ventos sopraram
terríveis visões
a chuva dilacerou-me
a alma


a verdade
é que toda uma noite
sozinho
me deixa vulnerável
contra meus próprios pensamentos

eu devo fugir
de mim mesmo


preciso fazer as malas
comprar cigarro
tomar café

"pego as malas e entro no ônibus"

"sem nunca olhar para trás novamente"

(Todos nós já vimos isso antes...)

mensagem não enviada para C.

Enquanto eu pensava no que lhe responder, minha cabeça foi mais longe, e por algum motivo, me perdi. Uma frase surgiu, dizendo: "certas pessoas não tem tempo para as outras".

Meu amigo diz que gosta dos encontros ao acaso, que surgem e se vão, marcando apenas aquele instante. Postos de conveniência lhe agradam, assim como aeroportos. São lugares de passagem. Você pode conhecer gente de diferentes tipos sem precisar criar vínculos.  Conversa e logo se despede. É quase um passatempo até a hora de ir, então não há qualquer tipo de incômodo em abordar ou ser abordado por estranhos.

Por outro lado, há aqueles que estão sempre a procurar alguém, sem nunca encontrar. O mundo parece um deserto. "É sempre noite, sempre frio".

No entanto, esses dois tipos são mais próximos do que aparentam: eles estão sempre sós.

domingo, fevereiro 23, 2014

não quero lhe escrever nada neste momento
tenho medo de dizer demais
ou de não dizer nada

tenho medo que você vá embora,
mas acho que se você ficar
não vai fazer diferença


me sinto bem estúpido
sem expressão
e incompleto

poderia escrever apenas:

"tanto faz"

e acho que tanto faz mesmo

Vagando 2 _ em meio ao caminho, uma fuga

–I"m only free on the way to the job.
And even then – I take the car.
–When are you free?
–When there's not too much traffic.

Vendedor de ternos para a câmera,
Le Joli Mai



Tenho vontade de sair e ver a cidade
aqui é tudo tão...
pouco
uma repetição que não se move

Andar de carro pela noite
ir até à puc de carona,
passando sobre o viaduto
pegar um ônibus de manhã
sábado
quinta à noite

sozinho em um auditório
rodeado de gente

pequenos prazeres que a gente quase esquece

caminhar de manhã
até que tudo fique para trás

quinta-feira, fevereiro 20, 2014

Vagando 1 _ poema pastiche

Sai na chuva
para caminhar
pelas ruas


Como uma sombra 
que se esgueira por entra as vielas
                                eu sou uma assombração urbana 
                                     Caminhando sozinho na noite 
                                                              atormentado
                              sob o silêncio quebrado da chuva


      O pedestre
         caminha 
– Um guarda chuva

um corpo

no metrô a minha tristeza se arrasta

levanto a cabeça
por um momento 
não sei quanto tempo se passou

sentando em um banco
eu não sabia mais o que era
ou onde estava
sabia apenas que estava triste.

Cada um a minha volta
parecia existir em si mesmo
difícil saber se de fato
estou neste mundo

As pessoas apenas
passam por mim
sem me olhar


É preciso ser
uma pedra
para não sumir
totalmente


Mas, o que são
alguns desses
seres se não
meras pedras?

desperto para um mundo

Por favor, não me procure
não olhe para mim quando passar

Este não é mais nosso mundo

Eu mal te conheço
Você mal me conhece

Talvez eu apenas pareça
com alguém de seu passado
que não existe mais

Alguém que caminhou
por seu quarto
que deitou na sua cama
junto a ti

Não sei dizer
Não posso dizer

Talvez tenha sido um sonho
que eu também tive
que eu também sonhei

Quem somos nós agora?

Pessoas quaisquer na multidão,
cuja a visão nos faz lembrar
de alguém que já se foi.

Apenas a memória
de um sonho.

terça-feira, fevereiro 18, 2014

sábado, fevereiro 08, 2014

Minha agonia produz
risos involuntários.

nos outros


"Nunca participaria
de um clube
que me aceitasse
como sócio"


____________________


(Está dito:
agora você tem
a chave
que me desvenda)

____________________


A confissão mais profunda
permanece um enigma:
Falei de mim para mim.

quinta-feira, fevereiro 06, 2014

temas de aniversário

o telefone tocou o dia todo

como é difícil ficar sozinho

as pessoas exigem uma resposta:
"atenda o telefone!"

talvez
pensem que estou
com problemas

mas a questão é simples:
não estou disponível


________________________


I am awake –
the summer depression
is biting like a dog

Desperto neste calor –
a depressão morde
como um cão

quarta-feira, fevereiro 05, 2014

o que resta

o que resta,
até mesmo da tristeza?

Alguém já deve
ter escrito
frases como:

"A tristeza invade
e inunda meu ser"

pensando o tempo
como um rio,
que arrasta
e invade
tudo

o sentimento
e a memória
nos afetam
pelo tempo.

mas o que trazem os novos tempos?

Dizer, agora: "a tristeza invade e inunda meu ser";

É dizer:
sou um corpo, que se arrasta;
sou um corpo que existe – só.
encerrado nele mesmo – eu –,
sinto tanto que o entorno perde a realidade

sou um corpo apenas
um espaço fora do tempo
– parado.

Um superfície a ser preenchida;
riscada.

Sou o oco do tempo;
o cadáver sem trabalho.

quinta-feira, janeiro 30, 2014

Não, não quero
escrever nada agora.

Sinto um aperto,
no peito.


E algo
que me puxa
para baixo.

Como se eu fosse um líquido.

Os músculos do meu rosto
parecem não se sustentar.

Minha expressão
escorre
crânio abaixo.
Como tinta fresca

Fecho os olhos
e posso ver o movimento interior
como se tudo viesse em minha direção.
Posso ouvir a sinapse do meu cérebro.

Meu corpo derrete...

Mas...

O copo d'água
não se importa.

quinta-feira, janeiro 23, 2014

Insight

Certas coisas são melhores
compreendidas
quando não explicadas

A "verdade" não é um estalo

Ela é o tempo.

______________

there are certain things
better understood
when not explained

truth is not a bang

it is time

_____________

Algumas coisas são mais fáceis 
de se entender
quando não explicadas

Escrever, Inscrever (Fragmento)

"A esperança é o primeiro sinal da derrota."

Citado por Henry Rollins




Escrever pode ser também um sinal de derrota.
Uma derrota que toma forma
–os resíduos do "tecido social"

Por que você escreve, por que faz seus filmes?

Eu faço na esperança de que alguém leia,
de que alguém os veja.
É a esperança de ser encontrado
– porque no momento estou perdido.

Meu nome está na lista telefônica (?)

"Publicar é
tornar público"

Por que o fazer,
se ninguém lê?

Escrevo notas aqui
e não sei quem as lê

são mensagens perdidas

Escrevo para que elas existam 
para que sejam uma marca 
na parede
daquilo que eu sinto

Escrevo para não esquecer

para existir


_____________


São brechas
por entre às quais
respiramos...

Aqui é uma imensa solidão.

Não sei e não posso arriscar dizer
se isto um dia chegará até alguém

mas, por enquanto
meu nome permanece listado
e junto a ele
estas mensagens

Retiro-me do silêncio e do esquecimento
e aqui inscrevo meu nome:  ......

quarta-feira, janeiro 15, 2014

Cor
Correndo sempre
atrás  daquilo
que  escapa  por  entre  os  dedos


A t r á s   daquilo
q ue , por entre  osdedos,
escapa – sempre


aquilo – nunca
para de correr



o que foge
nos persegue

aquilo que de
nós escapa

a               o que me 
tu                    tu que



tu, que me escapa sempre,
não  deixa  de me perseguir


estou preso 
àquilo que
me escapa – sempre



| tu
 que  é  ausência
 se   prende à  mim


tua ausência
se prende à mim –
ò, estranha/desconhecida

sábado, janeiro 04, 2014

Sensação, 3:45

Oh Yes

there are worse things than
being alone
but it often takes decades
to realize this
and most often 
when you do
it's too late
and there's nothing worse
than 
too late. 
_Charles Bukowski


Não saber ficar sozinho
é sempre sinal de que algo não vai bem.
é quando precisamos da companhia dos outros
para esconder algum vazio

e normalmente você passa o tempo
longe de casa, no trabalho, na faculdade
na casa de um amigo.
você evita ficar em seu quarto, em sua sala.
Nem mesmo pensa em ficar com seus livros,
seus deveres e tarefas.
Você foge de tudo.
Foge de si mesmo.

Mas, não é também 
estranho
quando você se 
habitua – bem demais –
a ficar sozinho?

A vida parece uma mentira,
no sentido dito por Beckett :

"Passa-se a vida esperando 
que disso resulte uma vida."

Você só está lá
para si mesmo,
esperando.

O refugio em em si mesmo
é o mais impenetrável de todos.